19/10/06

PASSATELLA ou La LEGGE


Depois do seu regresso de Moscovo em Junho de 1956 e já com a decisão tomada de cortar com o estalinismo, Roger Vailland resolve fazer uma viagem de automóvel por Itália com a sua mulher Élisabeth.
Essa viagem leva-o até Gargano.
Aí vai conhecer um jogo. A Passatella ou La Legge ( A Lei ) como é designado na região.

Servirá de base ao seu romance "La Loi " ( em português "A Lei" Livro de Bolso 101 editado pela "Europa América" em 1975). Escreve-o em poucos meses e será Prémio Goncourt em 1957.

Eis o jogo descrito pelo próprio Roger Vailland :

" A lei joga-se em toda a Itália meridional. Decompõe-se em duas fases. A primeira fase tem por fim designar um ganhador, que se chamará padrone ( patrão ); escolhe-se o mais rapidamente possível, quer às cartas, quer aos dados, e também se poderia tirar o patrão à sorte. Nessa tarde escolheram os tarots para fazerem falar a sorte.
Pizzacio ganhou a primeira volta de tarots e foi assim designado patrão.
O taberneiro trouxe uma bilha de vinho, que colocou junto de Pizzacio; alguns homens que bebiam ao balcão aproximaram-se e fizeram círculo em volta da mesa. Toda a gente se calou.
É após a designação do patrão que começa a segunda fase do jogo da lei. Esta decompõe-se em dois movimentos. Primeiramente o patrão escolhe um sotto-padrone ( vice-patrão).
Pizzacio pôs os olhos sucessivamente em cada um dos cinco outros jogadores, depois o seu olhar voltou a este , àquele, fingindo indecisão. Fez esperar. Conhece bem a lei.
- Vá - disse o taberneiro. - Já está cozida a tua pizza.
- Não está ainda apurada - disse Pizzacio.
Tinha nesse momento os olhos em Tonio.
- Tonio - começou ele - tem uma linda cunhada...
Todos os olhares se fixaram em Tonio, que ficou imóvel, com os olhos baixos, as mãos assentes na mesa.
O ganhador, o patrão, que faz a lei, tem o direito de dizer e de não dizer, de interrogar e de responder em lugar do interrogado, de elogiar e de censurar, de injuriar, de insinuar, de maldizer, de caluniar e de atingir a honra; os que perdem, que sofram a lei, têm o dever de sofrer em silêncio e na imobilidade. Tal é a regra fundamental do jogo da lei."
( págs. 32 e 33 da referida edição portuguesa )

Voltarei a este livro, que é escrito numa fase em que a ruptura dolorosa de Roger Vailland com o estalinismo o leva a " girar em redor da ideia de soberania, o contrário, ou o pólo positivo, daquilo a que Marx chama alienação " ( "Escritos Íntimos" - Vol 2 - pág 36 - "Europa América ")

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