15/05/07

Don Cesare e os portugueses

" Entre 1904 e 1914, entre os vinte e os trinta anos, ( Don Cesare ) tinha viajado por toda a Europa, durante as férias universitárias, para completar a sua educação, segundo o desejo do seu pai. Um Verão, quando voltava de Londres, ao ir embarcar em Valência para Nápoles, tinha passado por Portugal. Tinha posto a si mesmo mil perguntas sobre o declínio dessa nação cujo império se tinha estendido à volta do Globo. Tinha conhecido escritores que não escreviam para ninguém; homens políticos que governavam para os Ingleses; homens de negócios que liquidavam os seus estabelecimentos do Brasil e viviam de pequenas rendas, em cidades de província, sem finalidade. Ele tinha pensado que era a pior das infelicidades nascer Português. Em Lisboa, pela primeira vez na sua vida, tinha-se encontrado com um povo que se tinha desinteressado.
Hoje, pensa que por sua vez os Italianos , os Franceses, os Ingleses se desinteressaram. O interesse emigrou para os Estados Unidos, para a Rússia, para a China, para as Índias. Ele vive num país que se desinteressou, salvo aparentemente as províncias do Norte, mas isso não passa de aparência, uma vez que os italianos do Norte, como os Franceses, escondem o seu desinteresse com o ruído dos seus automóveis e das suas
scooters. Os Italianos e os Franceses começaram a portugalizar-se depois da Segunda Guerra Mundial. Eis o que ele pensa, sem lhe atribuir grande interesse."
( in "A Lei" de Roger Vailland, pág. 65 da edição "Livros de Bolso" da Europa América )


Roger Vailland escreveu "A Lei" em 1956 e ganhou, em 1957, o Prémio Goncourt. A acção passa-se no sul de Itália e Don Cesare é o aristocrata decadente de Porto Manacore.

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